Deleuze: Arte e Resistência

Qual a relação entre a obra de arte e o ato de resistência?
Nenhuma. Esta resposta, provocativa e alusiva ao trecho de Deleuze, consubstanciada acima, visa evitar uma supervalorização da arte como caminho de libertação e resistência, muitas vezes apontado como o único possível, mas isso não quer dizer que se deva descartar a relação proposta por Deleuze.  Parece-me que este se refere ao foro mais íntimo de resistência, aquele em que o indivíduo se vê obrigado a lidar com as pressões e aspersonas que se impõem na vida em sociedade, com as pequenas opressões do cotidiano, da pedestre faixa; é a arte “mescalina o homosexualidad o luna de Valencia, arte nostalgia, complexo da Arcadia, etc.”(3) . Nesse sentido, a resistência só pode existir enquanto ato, somente se plasma na criação e no usufruto individual que independem parcialmente do ciclo manifestação-expressão-compreensão da comunicação; parcialmente, pois na formação da estética-história estes processos intervêm constantemente. Uma resistência no âmbito micropolítico? Talvez. E por ser pertinente a este âmbito, deveríamos descartar sua influência no âmbito macropolítico? Seria ingênuo procurar separar artificialmente as duas esferas, posto que nenhum processo de dominação pode existir sem a interiorização dos valores hegemônicos nas relações sociais mais básicas. A arte, neste contexto, é uma das formas de interiorização da opressão e também de resistência a ela, todos os governos autoritários compreenderam bem isso, buscando controlá-la quer seja por meio da censura explícita, como nas ditaduras latino-americanas, pela produção intensa como no caso do nazismo, ou pela tirania do mercado e do gosto da maioria, como nas democracias ocidentais. Assim, o que se pretendeu aqui, foi desconstruir uma noção pueril de arte como ente anistórico e detentor por si de um potencial transformador e repor em jogo as forças e interesses que se debatem em sua violenta arena. A arte é, enfim, um campo de lutas constantes, em que se manifestam forças ortodoxas, heterodoxas, interesses distintos, e não um instrumento sacro ou meio inócuo onde a esquerda pode depositar suas esperanças sempre que se esgotam as convicções políticas.